História social do LSD no Brasil: Os primeiros usos medicinais e o começo da repressão
Osmar Ludovico da Silva era um jovem de classe média, morador do bairro da Pompeia, em São Paulo, quando decidiu "botar o pé na estrada", segundo suas palavras: mudou-se para a Europa antes do golpe de 1964, viveu em diversos países e se aproximou das formas de agir e pensar que compunham a nascente contracultura dos anos 1960 e 1970. Envolvido com o comércio de haxixe para se sustentar, teria se tornado intermediário de um traficante libanês e, depois, tentado buscar direto na fonte, em Beirute, para vender na Dinamarca, onde vivia. Foi detido em 1968 com treze quilos de haxixe escondidos no painel do carro e passou um ano preso, entre penitenciária comum e uma espécie de manicômio judicial. Superlotação, torturas. Lá, Osmar conheceu Barry John Holohan — australiano de rígida criação católica, sócio de cassino em Londres, e que, posteriormente, se descreveu como alguém que entrou para o tráfico mais em busca de aventuras do que de dinheiro —, preso pelo mesmo motivo. Quando soltos, Barry foi para a Califórnia, Osmar voltou para São Paulo. Os dois tinham um plano em vista: vender LSD no Brasil para comprar cocaína, que seria vendida na Europa. Parece um enredo policial — e não deixa de ser —, mas é assim que começa o livro História social do LSD no Brasil: os primeiros usos medicinais e o começo da repressão, de Júlio Delmanto, fruto de uma pesquisa de doutorado defendida na Universidade de São Paulo. A capa não é uma viagem. Quer dizer, é uma viagem, claro, mas não uma viagem aleatória. Aliás, sim, é uma viagem aleatória — qual não é? Enfim, o que estamos querendo dizer é que a ilustração da capa, assinada pela nossa diretora de arte, Bianca Oliveira, foi baseada livremente na descrição da primeira experiência que o poeta Roberto Piva teve com o LSD, nos anos 1960, na Serra da Cantareira, em São Paulo. "Fomos em dois carros, junto com outras pessoas que também tomaram a droga. Lá, eu entrei no meio do mato e repentinamente, quando bateu o ácido, olhei para o sol e vi como se fosse uma grande tangerina gotejando amor para o universo", descreve Piva, em trecho reproduzido em História social do LSD no Brasil. "Então tirei a roupa. Fiquei totalmente nu, e caminhei por todo aquele mato sem me machucar em nenhum espinho." A geração dos beats paulistanos, que teve em Piva um dos seus expoentes literários, recebe atenção especial no livro, bem como outros grupos de vanguarda artística que também embarcaram na psicodelia quando o LSD começou a chegar no Brasil — com destaque para os tropicalistas. Já ouviram falar nas "dunas da Gal?". Pois então. Muita coisa que aconteceu na cultura brasileira nos anos 1960 e 1970 permanece relativamente desconhecida. Mas o historiador Júlio Delmanto não se limitou, porém, ao âmbito do que muita gente chamaria simplesmente de "curtição". O livro se dedica a entender o caminho das pesquisas realizadas no país sobre os efeitos medicinais e terapêuticos da dietilamida do ácido lisérgico. Assim como em outros lugares do mundo, foram cientistas curiosos por conhecer os efeitos da nova droga que trouxeram o LSD ao Brasil. Na época, a Sandoz — farmacêutica suíça onde trabalhava Albert Hofmann, responsável pela descoberta do ácido, em 1943 — fornecia doses puras da substância para todo pesquisador que quisesse estudá-la. Esse fornecimento, depois, seria interrompido, devido a uma intrincada rede de interesses políticos internacionais que Júlio Delmanto aborda no livro. Com a proibição do LSD, as redes de tráfico passaram a se estruturar em todo o mundo e, de maneira quase improvisada, chegaram por aqui na bagagem de jovens vindos dos Estados Unidos em plena vigência da ditadura (1964-1985). A ação das autoridades, o comportamento da imprensa e a cena cultural da época fornecem a matéria-prima principal da pesquisa que deu origem a História social do LSD no Brasil.
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História social do LSD no Brasil: Os primeiros usos medicinais e o começo da repressão
Osmar Ludovico da Silva era um jovem de classe média, morador do bairro da Pompeia, em São Paulo, quando decidiu "botar o pé na estrada", segundo suas palavras: mudou-se para a Europa antes do golpe de 1964, viveu em diversos países e se aproximou das formas de agir e pensar que compunham a nascente contracultura dos anos 1960 e 1970. Envolvido com o comércio de haxixe para se sustentar, teria se tornado intermediário de um traficante libanês e, depois, tentado buscar direto na fonte, em Beirute, para vender na Dinamarca, onde vivia. Foi detido em 1968 com treze quilos de haxixe escondidos no painel do carro e passou um ano preso, entre penitenciária comum e uma espécie de manicômio judicial. Superlotação, torturas. Lá, Osmar conheceu Barry John Holohan — australiano de rígida criação católica, sócio de cassino em Londres, e que, posteriormente, se descreveu como alguém que entrou para o tráfico mais em busca de aventuras do que de dinheiro —, preso pelo mesmo motivo. Quando soltos, Barry foi para a Califórnia, Osmar voltou para São Paulo. Os dois tinham um plano em vista: vender LSD no Brasil para comprar cocaína, que seria vendida na Europa. Parece um enredo policial — e não deixa de ser —, mas é assim que começa o livro História social do LSD no Brasil: os primeiros usos medicinais e o começo da repressão, de Júlio Delmanto, fruto de uma pesquisa de doutorado defendida na Universidade de São Paulo. A capa não é uma viagem. Quer dizer, é uma viagem, claro, mas não uma viagem aleatória. Aliás, sim, é uma viagem aleatória — qual não é? Enfim, o que estamos querendo dizer é que a ilustração da capa, assinada pela nossa diretora de arte, Bianca Oliveira, foi baseada livremente na descrição da primeira experiência que o poeta Roberto Piva teve com o LSD, nos anos 1960, na Serra da Cantareira, em São Paulo. "Fomos em dois carros, junto com outras pessoas que também tomaram a droga. Lá, eu entrei no meio do mato e repentinamente, quando bateu o ácido, olhei para o sol e vi como se fosse uma grande tangerina gotejando amor para o universo", descreve Piva, em trecho reproduzido em História social do LSD no Brasil. "Então tirei a roupa. Fiquei totalmente nu, e caminhei por todo aquele mato sem me machucar em nenhum espinho." A geração dos beats paulistanos, que teve em Piva um dos seus expoentes literários, recebe atenção especial no livro, bem como outros grupos de vanguarda artística que também embarcaram na psicodelia quando o LSD começou a chegar no Brasil — com destaque para os tropicalistas. Já ouviram falar nas "dunas da Gal?". Pois então. Muita coisa que aconteceu na cultura brasileira nos anos 1960 e 1970 permanece relativamente desconhecida. Mas o historiador Júlio Delmanto não se limitou, porém, ao âmbito do que muita gente chamaria simplesmente de "curtição". O livro se dedica a entender o caminho das pesquisas realizadas no país sobre os efeitos medicinais e terapêuticos da dietilamida do ácido lisérgico. Assim como em outros lugares do mundo, foram cientistas curiosos por conhecer os efeitos da nova droga que trouxeram o LSD ao Brasil. Na época, a Sandoz — farmacêutica suíça onde trabalhava Albert Hofmann, responsável pela descoberta do ácido, em 1943 — fornecia doses puras da substância para todo pesquisador que quisesse estudá-la. Esse fornecimento, depois, seria interrompido, devido a uma intrincada rede de interesses políticos internacionais que Júlio Delmanto aborda no livro. Com a proibição do LSD, as redes de tráfico passaram a se estruturar em todo o mundo e, de maneira quase improvisada, chegaram por aqui na bagagem de jovens vindos dos Estados Unidos em plena vigência da ditadura (1964-1985). A ação das autoridades, o comportamento da imprensa e a cena cultural da época fornecem a matéria-prima principal da pesquisa que deu origem a História social do LSD no Brasil.
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História social do LSD no Brasil: Os primeiros usos medicinais e o começo da repressão

História social do LSD no Brasil: Os primeiros usos medicinais e o começo da repressão

by Júlio Delmanto
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Osmar Ludovico da Silva era um jovem de classe média, morador do bairro da Pompeia, em São Paulo, quando decidiu "botar o pé na estrada", segundo suas palavras: mudou-se para a Europa antes do golpe de 1964, viveu em diversos países e se aproximou das formas de agir e pensar que compunham a nascente contracultura dos anos 1960 e 1970. Envolvido com o comércio de haxixe para se sustentar, teria se tornado intermediário de um traficante libanês e, depois, tentado buscar direto na fonte, em Beirute, para vender na Dinamarca, onde vivia. Foi detido em 1968 com treze quilos de haxixe escondidos no painel do carro e passou um ano preso, entre penitenciária comum e uma espécie de manicômio judicial. Superlotação, torturas. Lá, Osmar conheceu Barry John Holohan — australiano de rígida criação católica, sócio de cassino em Londres, e que, posteriormente, se descreveu como alguém que entrou para o tráfico mais em busca de aventuras do que de dinheiro —, preso pelo mesmo motivo. Quando soltos, Barry foi para a Califórnia, Osmar voltou para São Paulo. Os dois tinham um plano em vista: vender LSD no Brasil para comprar cocaína, que seria vendida na Europa. Parece um enredo policial — e não deixa de ser —, mas é assim que começa o livro História social do LSD no Brasil: os primeiros usos medicinais e o começo da repressão, de Júlio Delmanto, fruto de uma pesquisa de doutorado defendida na Universidade de São Paulo. A capa não é uma viagem. Quer dizer, é uma viagem, claro, mas não uma viagem aleatória. Aliás, sim, é uma viagem aleatória — qual não é? Enfim, o que estamos querendo dizer é que a ilustração da capa, assinada pela nossa diretora de arte, Bianca Oliveira, foi baseada livremente na descrição da primeira experiência que o poeta Roberto Piva teve com o LSD, nos anos 1960, na Serra da Cantareira, em São Paulo. "Fomos em dois carros, junto com outras pessoas que também tomaram a droga. Lá, eu entrei no meio do mato e repentinamente, quando bateu o ácido, olhei para o sol e vi como se fosse uma grande tangerina gotejando amor para o universo", descreve Piva, em trecho reproduzido em História social do LSD no Brasil. "Então tirei a roupa. Fiquei totalmente nu, e caminhei por todo aquele mato sem me machucar em nenhum espinho." A geração dos beats paulistanos, que teve em Piva um dos seus expoentes literários, recebe atenção especial no livro, bem como outros grupos de vanguarda artística que também embarcaram na psicodelia quando o LSD começou a chegar no Brasil — com destaque para os tropicalistas. Já ouviram falar nas "dunas da Gal?". Pois então. Muita coisa que aconteceu na cultura brasileira nos anos 1960 e 1970 permanece relativamente desconhecida. Mas o historiador Júlio Delmanto não se limitou, porém, ao âmbito do que muita gente chamaria simplesmente de "curtição". O livro se dedica a entender o caminho das pesquisas realizadas no país sobre os efeitos medicinais e terapêuticos da dietilamida do ácido lisérgico. Assim como em outros lugares do mundo, foram cientistas curiosos por conhecer os efeitos da nova droga que trouxeram o LSD ao Brasil. Na época, a Sandoz — farmacêutica suíça onde trabalhava Albert Hofmann, responsável pela descoberta do ácido, em 1943 — fornecia doses puras da substância para todo pesquisador que quisesse estudá-la. Esse fornecimento, depois, seria interrompido, devido a uma intrincada rede de interesses políticos internacionais que Júlio Delmanto aborda no livro. Com a proibição do LSD, as redes de tráfico passaram a se estruturar em todo o mundo e, de maneira quase improvisada, chegaram por aqui na bagagem de jovens vindos dos Estados Unidos em plena vigência da ditadura (1964-1985). A ação das autoridades, o comportamento da imprensa e a cena cultural da época fornecem a matéria-prima principal da pesquisa que deu origem a História social do LSD no Brasil.

Product Details

ISBN-13: 9786599014161
Publisher: Editora Elefante
Publication date: 08/10/2020
Sold by: Bookwire
Format: eBook
Pages: 480
File size: 3 MB
Language: Portuguese

About the Author

Júlio Delmanto é formado em jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero, com mestrado e doutorado em história social pela Universidade de São Paulo. É autor de Camaradas caretas: drogas e esquerda no Brasil (Alameda, 2015), além de diversos artigos sobre o tema. Faz parte da organização da Marcha da Maconha em São Paulo e do Coletivo Desentorpecendo a Razão (DAR).

Table of Contents

Introdução 1. A contracultura nos Estados Unidos Os Sixties Anarquistas místicos: os beats e as drogas Ainda os Sixties: Vietnã, rebeliões estudantis e por direitos civis A revolta dos não oprimidos: marcos iniciais da contracultura Veículo para a consciência cósmica: drogas e contracultura LSD, a pedra filosofal Kesey e Leary 2. A contracultura no Brasil O avesso da modernização Luiz Carlos Maciel, o guru Os beats paulistanos Drogas e Tropicália Swinging London 3. O LSD no Brasil Primeiros trabalhos acadêmicos Murilo Pereira Gomes: entender nosso papel na peça da vida Cesário Morey Hossri: da parapsicologia à caça de diamantes Jamil Haddad: desdobrar e tresdobrar a personalidade O começo da cobertura midiática 4. O primeiro processo judicial por tráfico de LSD no Brasil "O declarante sentiu amor por todas as pessoas" Repercussões do caso na imprensa "Grã-finos tomavam LSD na 'Festa do Embalo'" Depoimentos dos réus em juízo "A polícia queria entrar na onda, e ela mesma traficar" Outras estratégias das defesas A sentença Antonio Peticov: "o papa do LSD" Osmar Ludovico da Silva: traficante, hippie, pastor Barry John Holohan: "Um dia eu vou matar Antonio Peticov" Considerações finais Bibliografia Agradecimentos Sobre O autor
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